O amor é uma das mais antigas e persistentes obsessões da arte, alvo de todo maravilhamento e perplexidade desde os primeiros registros formais. No curso/oficina Escrever Gestos de Amor escolhemos uma lente específica para tomar pé dessa complexa humanidade: a literatura.
A partir de uma seleção de grandes autores e textos curados a partir de uma pesquisa contínua do assunto, faremos um percurso nas molduras que a ficção faz do amor: a força e a fragilidade, a beleza e o estranhamento, os desejos e aversões quando o que está em jogo é o desejo de contar uma história.
Entre mitologias e literaturas de diferentes épocas, estilos e abordagens amorosas, uma constatação em comum:
Nos domínios de uma história de amor, estamos sempre obrigados a dar de cara também com o seu ponto cego, com o seu texto caprichosamente invisível - o claro enigma.
De que maneira dependeríamos justo disso, do ilegível em palavras, para dar a vez ao apaixonamento?
Ao nosso lado ao longo da travessia, uma hipótese-convite:
A ficção, mais do que um gênero literário, é uma providência humana: a criação ancestral à qual recorremos desde sempre quando não estamos em consenso com o significado daquilo que nos acontece. Quanto mais não sabemos o que a coisa quer dizer, mais próximos estamos de que ela aceite ser uma história. Ao nos faltarem os sentidos, surge a ficção.
Modelo dos encontros:
Cada noite começa com uma parte expositiva em que percorreremos conceitos e símbolos do amor desde a antiguidade até os nossos dias, seus rituais e registros, contextos e incertezas como pontos de partida para alquimia de uma história.
Dessa ponte, leremos em profundidade um texto literário por noite, de braços dados com grandes autores e poetas generosos na criação do invisível. Vamos observar entre eles a persistência de quatro gestos criativos:
SIMBOLISMO,
AMBIGUIDADE,
IMAGEM,
SUSPENSÃO
Este é um percurso pensado para quem se interessa:
- pelo amor como gesto humano e também como gesto artístico;
- por um percurso guiado na literatura brasileira e internacional sobre o tema;
- por “ler como um escritor” a foz dos textos: movimentos, ritmos, volumes, suavidades;
- por escrever, ao fim, se esse for o desejo (ou não escrever, dando ao desejo outro destino tão genuíno quanto).
>>> A interlocução para os textos produzidos pelos integrantes terá uma proposta específica que será apresentada no primeiro encontro.
Se você leu até aqui e sente que essa proposta é para você, entenda também que:
Esta não é uma oficina "romântica". Tampouco terapêutica, biográfica.
Escrever Gestos de Amor é um percurso na ficção e este será nosso ponto de partida e de chegada. Toda a interlocução criada no ambiente da oficina tomará o cuidado ético de não debater experiências biográficas dos participantes.
Bibliografia: navegaremos pelo imaginário poético do amor em Clarice Lispector, Ingmar Bergman, Vilma Arêas, Annie Ernaux, bell hooks, Yasmina Reza, Leonard Cohen, Marguerite Duras, Manuel António Pina, Machado de Assis, Italo Calvino, Tobias Carvalho, Geni Núñez, Renato Noguera, Ana Suy e Anne Carson, entre outros.
Duração:
6 encontros, online
Às segundas-feiras, das 19h – 21:30hs
de 19 de maio a 23 de junho de 2025
Informações gerais:
- Aulas online, ao vivo, link fornecido por email diretamente ao grupo.
- Encontros gravados. As gravações ficam disponíveis por 3 meses após o término da oficina.
- Textos de referência disponibilizados aos participantes em formato PDF;
Bolsas disponíveis para quem se encontra em situação de vulnerabilidade: [email protected].
** Percurso dos Encontros **
#Encontro 1
Dançar a mesma música à distância: enredo, episódio, a questão singular de cada amor
*Italo Calvino_Os amores difíceis (conto)
*Vilma Arêas_Um beijo por mês (conto)
Vamos começar estudando algumas imagens propostas pela filosofia e pela mitologia na compreensão do “estado amoroso”.
A partir disso debateremos a construção do enredo em uma história de amor. Como uma história começa?
#Encontro 2
O instante do desejo é maior do que um caso inteiro de amor: o arco narrativo, o percurso do texto.
*Clarice Lispector_Todos os contos (conto)
No segundo encontro vamos observar juntos o que o recorte de um episódio amoroso, o instante, causa de efeito em quem lê e vive, por magnetismo e salivação. O que uma história é capaz de encampar em seu tempo, quais são os campos de força em jogo no sabor de um texto?
#Encontro 3
Procurar o calor de alguém ausente: narrador, ponto de vista, olhar amoroso
*Annie Ernaux_Paixão simples (romance, trecho)
*Annie Ernaux_Trechos do diário íntimo
Vamos investigar a construção do ponto de vista amoroso. Estranhamento, pertencimento, alucinação, delírio, apaixonamento: o que surge iluminado em cada amor dependendo de quem conduz a narrativa.
#Encontro 4
Começar o amor pelo corpo: personagens, presenças, a manifestação do corpo
*Tobias Carvalho_As coisas (conto)
*Ingmar Bergman_Cenas de um casamento (roteiro, filme – trecho)
Vamos mergulhar em profundidade na observação de personagens dentro de jogos amorosos: como se revelam, expõem, contornam; quais são os detalhes que mostram um ser humano acontecendo diante do leitor – e como tudo isso sustenta o olhar para a vida. Onde estão os gestos que revelam a singularidade de cada pequeno amor?
#Encontro 5
Entrar no amor como em casa: cenário, ambiente
*Yasmina Reza_Felizes os felizes (romance, trecho)
*Manuel António Pina_O coração pronto para o roubo (poema)
Qual o papel do ambiente em uma história de amor, de que modo o entorno ajuda a criar as circunstâncias para que as personagens se manifestem (os corpos surjam, os gestos nasçam). Como os próprios objetos podem agir como símbolos, representando marcas amorosas profundas que entram no jogo com as palavras?
#Encontro 6
Amar sem compreender: conflito, contradição, perspectiva
*Machado de Assis_Contos selecionados (conto)
* Leonard Cohen_carta
* Geni Núñez_O que fica depois da raiva (conceitos a partir da etnia Guarani)
Vamos investigar a intimidade entre amor e conflito: o que esse amor está passando?, o que nenhuma palavra precisa explicitar? Vamos observar as sutilezas que dão perspectiva e trazem ponto de sombra ao que está bem iluminado.
>> Bibliografia principal e complementar:
Marguerite Duras_O amante (romance)
Geni Núñez_psicóloga e pesquisadora (conceitos a partir da etnia Guarani)
Clarice Lispector_Todos os contos (conto)
Anne Carson_Eros, o doce amargo (ensaio)
Italo Calvino_Os amores difíceis (conto)
Annie Ernaux_Paixão simples (romance)
Ingmar Bergman, Cenas de um casamento (dramaturgia)
Yasmina Reza_Felizes os felizes (trecho)
Wyslawa Szymborska_Um amor feliz (poema)
Manuel António Pina_O coração pronto para o roubo (poema)
Tobias Carvalho_As coisas (conto)
bell hooks_Tudo sobre o amor (ensaio)
Machado de Assis_Contos completos (conto)
>> Alguns conteúdos audiovisuais sugeridos:
Cenas de um casamento, Ingmar Bergman, adaptação Hagai Levi (série)
Paterson, Jim Jarmusch (filme)
The heart of a dog, Laurie Anderson (documentário ficcional)
Marianne & Leonard, Words of love, Nick Broomfield (documentário)
José & Pilar, Miguel Gonçalves Mendes (documentário)
Babenco - Alguém Tem que Ouvir o Coração e Dizer: Parou, Bárbara Paz (documentário)
A secret love, Chris Bolan (documentário)
Take this Waltz, Sarah Polley (filme)
*Pintura usada na divulgação da oficina: Henri Matisse, "Interior com duas pessoas; Janela aberta" (1922). Reprodução de domínio público.