A PRESENÇA DO FEMININO NA LITERATURA E NA MITOLOGIA

A leitura das obras clássicas da literatura mundial, bem como as discussões recentes no âmbito da crítica literária, nos mostra a inegável relevância da figura feminina em nossa cultura. Tal relevância assume uma dimensão ainda mais impactante se considerarmos que, na visão de Daniela Flieger Nascimento (@terapiainteligente), o feminino, enquanto dimensão da existência humana e não simplesmente enquanto gênero configurado por construções sociais, encontra-se ferido nos mais diversos níveis e instâncias da sociedade. A ferida do feminino está também presente no próprio movimento feminista, em pautas que, ao invés de aproximar as mulheres de causas que verdadeiramente interessam a elas, as distanciam entre si e reforçam valores que, ao fim e ao cabo, são eminentemente masculinos. 

Mas o que é o feminino?

O feminino diz respeito ao universo dos sentimentos, da subjetividade, das percepções advindas da intuição, ao mundo dos sonhos e do inconsciente, um mundo lunar, em que o tempo nunca é linear e a necessidade de vínculos profundos se faz necessária e, até mesmo, indispensável para a sobrevivência.

Se o masculino corresponde ao mundo externo e às realizações relacionadas à intelectualidade e à produtividade, o feminino corresponde ao mundo interno das emoções, vivenciado por meio dos sentimentos e não por meio de valores que nos conectam ao próprio masculino e não exatamente a uma verdadeira essência do feminino. 

Considerando todas essas questões, a proposta deste curso é trabalhar com algumas representações do feminino na literatura e na mitologia sem recorrer, necessariamente, aos estudos feministas e de gênero, apesar de reconhecer sua validade para o debate acadêmico atual.

O principal conceito filosófico que utilizaremos para nos aproximar do feminino enquanto representação afeto (DINIZ, 2020), será o conceito de presença, de Hans Ulrich Gumbrecht. Presença pode ser entendida como toda e qualquer relação de tangibilidade estabelecida com objetos culturais percebidos não apenas como instâncias articuladoras de sentido, mas como objetos capazes de proporcionar experiência estética. Esta, por sua vez, se estabelece a partir da oscilação entre efeitos de sentido e efeitos de presença, o que justifica a relevância de uma leitura que priorize os aspectos estéticos sem negligenciar os processos de atribuição de sentido. Lançaremos mão, ainda, de conceitos da psicologia analítica de Carl Jung, entre eles animus, anima e arquétipos, além do conceito de performance, do pensador suíço Paul Zumthor, para pensar em aspectos relativos à presença do feminino e do masculino na literatura e na mitologia. 

Quando acontece?

O curso consistirá em cinco encontros às segundas-feiras, das 19h às 21h30, realizados pela plataforma Google meet, e será ministrado pela professora Greicy Pinto Bellin.

Haverá emissão de certificado com 25 horas complementares.

Público alvo: alunos de graduação e pós-graduação de Letras e áreas afins, alunos de graduação de pós-graduação em Psicologia, contadores de histórias e demais interessados no tema.

Vamos conferir o cronograma?

04/07
Iniciaremos o curso com uma apresentação geral das obras e da matriz conceitual a ser utilizada nas análises. Realizaremos a leitura de “A presença realizada na linguagem: com especial atenção para a presença do passado”, de Hans Ulrich Gumbrecht.

11/07
No segundo encontro será abordado o feminino ferido, a ancestralidade e leitura e análise dos mitos gregos: Atena e Afrodite; Perséfone e Deméter; Eros e Psiquê; Hera e Héstia e A Jornada da Heroína (Joseph Campbell e Maureen Murdock).

18/07
Em nosso terceiro encontro analisaremos contos de fadas dos Irmãos Grimm e Charles Perrault: O Barba Azul; Branca de Neve; A Bela e a Fera; Pele de Asno; A Bela Adormecida e Cinderela.

25/07

Nesta aula nos debruçaremos sobre as mulheres místicas na Idade Média e no século XVI até a contemporaneidade: Hildegard Von Bingen; Marguerite Porete e as Beguines; Hadewijch de Antuérpia; Metchilde de Magdeburgo; Teresa de Ávila/Santa Teresa de Jesus e o Castelo Interior; Simone Weil e o misticismo moderno.

01/08
Para encerrar em grande estilo, analisaremos as narrativas presentes no livro Mulheres que correm com os lobos, de Clarissa P. Estés: La Loba; A mulher esqueleto;  Os sapatinhos vermelhos; La Llorona; A mulher dos cabelos de ouro; O urso da meia-lua. 

REFERÊNCIAS

BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise nos contos de fadas. Trad. Arlene Caetano. São Paulo: Paz e Terra, 2002.

BÍBLIA SAGRADA. São Paulo: Ed. Ave Maria, 2016.

 DINIZ, Lígia Gonçalves. Por uma impossível fenomenologia dos afetos: imaginação e presença na experiência literária. Tese de Doutorado. Departamento de Teoria Literária e Literaturas, Universidade de Brasília, 2016. Disponível em: https://www.capes.gov.br/images/stories/download/pct/2017/Teses-Premiadas/Linguistica-e-Literatura-Ligia-Goncalves-Diniz.PDF Acesso em: 17/05/2021.

 ______. Imaginação como presença: o corpo e seus afetos na experiência literária. Curitiba: Ed. UFPR, 2020.

 ESTÉS, Clarissa Pinkola. Contos dos Irmãos Grimm. Trad. Lia Wyler. Rio de Janeiro: Rocco, 2005. 

 _______. Mulheres que correm com os lobos: mitos e histórias do arquétipo da mulher selvagem. Trad. Waldéa Barcellos. Rio de Janeiro: Rocco, 2018.

GUMBRECHT, Hans Ulrich. Atmosfera, ambiência e Stimmung: por um potencial oculto da literatura. Trad. Ana Isabel Soares. Rio de Janeiro: Contraponto, 2014.

 _______. Produção de presença: o que o sentido não consegue transmitir. Trad. Ana Isabel Soares. Rio de Janeiro: Contraponto, 2010.

 _______. A presença realizada na linguagem: com especial atenção para a presença do passado. Trad. Bruno Diniz e Juliana Jardim Oliveira. História da Historiografia, Ouro Preto, n. 3, 2009, p. 1-22.

 _______; PFEIFFER, Karl Ludwig. Materialities of communication. Trans. William Whobrey. Stanford University Press, 1994.

 GUTIÉRREZ, Jorge Luís Rodriguez. A filosofia mística de Teresa de Ávila. Revista Caminhando: v. 8, n. 1, 2003, p. 127-157.

 JESUS, Santa Teresa de. O Castelo Interior: a jornada espiritual da alma para se unir a Deus. Trad. Antônio Carlos de Souza. Curitiba, 2016.

 JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Trad. Maria Luísa Appy e Dora Mariana Ferreira da Silva. Petrópolis: Vozes, 2000.

 NASCIMENTO, Daniela Flieger. A tecelã e o feminino ferido. 2020. Disponível em: https://hotmart.com/pt-br/marketplace/produtos/a-tecela-e-o-feminino-ferido/A42229119Q Acesso em: 11/05/2022.

 PERRAULT, Charles. Contos de Perrault. Trad. Regina Régis Junqueira. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1985.

 WEIL, Simone. Gravity and Grace. New York: Routledge, 2003.

 ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção e leitura. Trad. Jerusa Pires e Suely Fenerich. São Paulo: Cosac Naify, 2007. 

 Está imperdível, não é mesmo?

Conhecendo mais sobre a professora ministrante

Greicy Pinto Bellin é pós-doutora em Letras pela Universidade Estadual de Campinas e pela Universidade Federal do Paraná, doutora e mestre em Estudos Literários e graduada em Letras também pela UFPR e professora titular do Programa de Pós-Graduação em Teoria Literária do Centro Universitário Campos de Andrade (UNIANDRADE). Seu primeiro livro, intitulado From European Modernity to Pan-American National Identity: Literary Confluences Between Edgar Allan Poe, Charles Baudelaire and Machado de Assis foi publicado em 2018 pela editora Peter Lang, Oxford, Inglaterra. Possui vários artigos sobre a obra machadiana publicados tanto no Brasil quanto no exterior. É tradutora da obra de Machado de Assis, sendo que Miss Dollar: Stories by Machado de Assis, foi publicado em 2016 pela editora New London Librarium, assim como Good Days!/Bons Dias!: Chronicles by Machado de Assis, publicado em 2018 pela mesma editora. É tradutora de Os poderes da filologia, de Hans Ulrich Gumbrecht, publicado em 2021 pela editora Contraponto. É líder dos grupos de pesquisa Machado de Assis: novas perspectivas e abordagens, e SEPP – Seminário de Estudos de Produção de Presença, ambos registrados no CNPq. Foi aluna do professor Gumbrecht em dois seminários da Universidade Hebraica de Jerusalém, Israel, sobre os temas: Genealogia do pensamento frio na cultura ocidental: Maquiavel, Gracián e Schopenhauer, e Mulheres Místicas, em abril/maio de 2021 e 2022, respectivamente.